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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

A Cultura como meio de auto-aprisionamento

Vivemos em uma cultura. O modo de agir, pensar, as classificações abstratas que colocamos em todas as coisas. Essa cultura é necessária para nos dar um sentido. É a coisa supérflua mais essencial entre todas as coisas supérfluas. Não realmente precisamos dela para viver. Mas usamos ela para atingir um falso senso de completude. Eu não acredito que um ser humano possa atingir completude de fato. E somos seres sociais. Dependemos do outro. Por que dependemos do outro, em nós foi se desenvolvendo um avançado instinto social, que hoje chamados de moral. Regrinhas não-faladas que regem nosso comportamento para com os outros. Basicamente falam sobre a liberdade de um terminando onde a do outro começa e vice-versa, sendo que todos devem ter o mesmo nível de liberdade. Uma manifestação mais física dessas regras se dá nas leis. As leis são uma maneira de enfatizar o convívio, tentar assegurar que nem uma pessoa vai prejudicar outra. Eu falei isso tudo pra explicar que eu respeito e aceito cultura, mas o tema não é ela em si.
E sim como, por necessitarmos estar inseridos nela, acabamos nos colocando dentro de estereótipos. E às vezes tudo bem, por que algumas vezes isso é uma coisa natural, às vezes o que parece um estereótipo de fato o é. O problema é quando somos alguma coisa que na verdade não somos só pra nos encaixar. Afinal, nós excluímos o que está fora do ordinário.
Nós mesmos nos prendemos. E é compreensível, vide a necessidade da socialização. Mas acontece que o peso disso é às vezes aterrador. Eu acredito que a pressão de tudo isso é o que muitas vezes leva a males psicológicos, como a depressão e até o suicídio. O sentimento de inadequação se equivale ao de impotência, de incapacidade na nossa sociedade, por que aqui uma coisa pode estar diretamente conectada à outra.
Eu gosto de exemplos, então eu vou dar um. Não é o exemplo mais extremo dessa influência, mas é um bom exemplo, um exemplo interessante. As mulheres são sexualizadas, e elas viram isso a seu favor, usando roupas decotadas. Isso, por sua vez leva a uma objetificação que permite o sentimento de posse que leva à violência. Além de que é mais uma coisa que torna mulheres culturalmente diferentes de homens, permitindo o estabelecimento de uma relação de superioridade entre homem e mulher, quase sempre o homem se considerando superior. Mas mesmo quando a mulher é considerada superior, isso não é benefício pra ela. Um homem possessivo pode alegar (e o faz) que é possessivo justamente por que dá valor à mulher. E, também, a sexualidade acaba sendo uma maneira de destacar o poder da mulher, através da ênfase na feminilidade dela, dizendo "eu tenho orgulho de ser mulher". Eu já fiz um post sobre feminismo. O meu exemplo é que aos homens é negado o "ser sexy". E não é uma negação dita. Esse é o valor do meu exemplo, o de ser uma coisa cultural, subentendida. Os homens até usam de sexismo, roupas coladas e músculos à mostra. As HQs são uma mostra extremamente exagerada disso. Mas, ainda assim, a sexualidade masculina não é vista tão naturalmente quanto a feminina. Sempre há um algo de sensação de ridículo se a sexualidade masculina é levada ao ponto em que a feminina vai. Os próprios homens não se sentem tão à vontade. É uma das coisas que a cultura acaba privando. Por que eu imagino o quanto deve ser intenso o senso de empoderamento de uma mulher ao se vestir e se sentir bonita, sexy e poderosa. Esse poder é negado à ala masculina. A sexualização da mulher é muito criticada, e é realmente machista, mas não posso deixar de pensar no fato de que isso se tornou importante para as mesmas. As mulheres gostam de se sentir desejadas. Apesar do machismo distorcer isso e colocar a sexualidade da mulher como uma justificação para sua objetificação. Não é visto ou falado que o lado de sexismo masculino é praticamente inexistente, negado não-verbalmente. Você, homem, não pode querer se sentir sexy, ou o ser, por que isso seria ridículo. E mais, seria gay, já que a sociedade vê gays como homens-mulher, novamente colocando o sexo como algo feminino. Os homens não podem, culturalmente, usar de sexualidade.

Isso é apenas um ínfimo exemplo, um de muitos. Eu não quero criticar a cultura ou a sociedade, apenas como estamos presos a ela, como nos deixamos manipular por algo que nem é real. A cultura é um acaso que acontece, uma evolução natural e aleatória das coisas, ela não reflete os desejos de alguém ou mesmo da sociedade. Ela não reflete o que é certo, o que é óbvio ou o que é básico. Ela é só uma coisa. E mesmo assim, consegue mandar, mesmo sendo abstrata. Mesmo sendo absolutamente supérflua. Ainda assim, podemos deixar de fazer algo que queremos, talvez até queríamos muito, fazer. Por nada. E principalmente por que, a despeito de sua efetiva irrelevância, a cultura realmente rege como as outras pessoas reagem ao nosso comportamento. E eu acho isso uma covardia, uma fraqueza. Uma fraqueza, que nos deixemos reger assim por algo inexistente. Uma fraqueza tanto da parte de quem deixa de fazer algo que quer fazer quanto da parte de quem julga os que tem a coragem. E uma fraqueza gigantesca.

2 comentários:

  1. Excluir o que está fora do ordinário, foi a expressão-chave, de seu texto, no meu entendimento. Às vezes não nos permitimos explorar a pluralidade de nosso ser, por estarmos presos a rótulos socialmente criados. Por exemplo, não vou me permitir a ouvir música caribenha, apesar de me sentir seduzido por ela pois cresci ouvindo rock, e ficaria excluído de certo grupo. A cultura criada pela sociedade capitalista, e não a naturalmente parida, digamos assim, nessa perspectiva, é excludente também.

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  2. Isso tem muito a ver com os grupos nos quais nos encaixamos. E isso por sua vez tem a ver com algo muito mais básico.

    Nós seres humanos, no passado, nos juntávamos em grupos como forma de sobrevivência. Poder nos números. Mas é claro que havia nosso espaçamento geográfico, que fez com que existisse não um, mas vários grupos de humanos em locais diferentes (mas nem sempre tão longínquos). Como somos da mesma espécie, precisamos dos mesmos exatos recursos. Desta forma, um grupo acabava ameaçando o outro, numa briga pelos recursos necessários pela sobrevivência. O outro passava a ser visto como inimigo. Esse comportamento se entranhou na sociedade e na mente humana, de modo que quem não é do grupo do qual a gente faz parte, é considerado diferente, às vezes até inimigo mesmo. A gente não só se separa em grupos baseados em afinidades, mas também rejeita outros grupos (e as pessoas inseridas neles).

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